Agenda na Saladearte: A Vida Invisível retrata o encontro-desencontro de irmãs marcadas pelo machismo

Por Luca Agra e Luciana Freire

O filme indicado pelo Brasil à corrida ao Oscar é A Vida Invisível. O drama do brasileiro Karim Aïnouz foi vencedor da mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes este ano, e estreou nessa quinta-feira (21), no circuito Saladearte. Ambientado na década de 1950, no Rio de Janeiro, o filme retrata a separação de duas irmãs Eurídice Gusmão (Carol Duarte) e Guida Gusmão (Julia Stockler). A principal questão que atravessa o filme é o machismo estrutural da sociedade, e como as irmãs são privadas de tomar decisões sobre suas vidas.

As duas irmãs são filhas de um casal português conservador, com uma hierarquia patriarcal explícita na dinâmica da família. Eurídice é a mais nova, introvertida, e a sua maior paixão é tocar piano. Ela sonha em estudar na Escola de Viena, desejo que persegue até o seu último fio de esperança. Guida é extrovertida, inconsequente, segue seus impulsos. Assim a trama se desenrola, Guida foge apaixonada com o grego Yorgus deixando a família abalada pela vergonha e Eurídice com o coração partido, culpada por ter a acobertado nas saídas a noite e triste pelo sentimento de abandono pela a irmã que amava tanto.

O filme é sobre o encontro-desencontro das irmãs e o amor pela família. Carol Duarte e Julia Stockler têm boa atuação durante todo o filme, são parecidas e convincentes sobre seu amor e determinação. Gregório Duvivier, conhecido por seus trabalhos de humor, foi convincente no drama como marido patético representando a masculinidade frágil. 

A ambientação no Rio de Janeiro na década de 1950 foi um recurso muito explorado, principalmente ao utilizar cartas para narrar o crescimento da personagem Guida. A cidade tem atenção em diversas cenas quase como um personagem. A Mata Atlântica envolve o elenco. Ela é mata fechada nos momentos de desespero e fica ao horizonte quando o sentimento é de saudade. Assim como o Cristo Redentor e o porto de navios da cidade, que aparecem como se deixassem explícita a espera e os braços abertos para o encontro das irmãs em um Rio de Janeiro que chove e sempre faz calor.

O tema do filme é pesado. As irmãs passam por vários dilemas em torno do machismo estrutural. Elas não tiveram escolha sobre casamento, sobre maternidade e trabalho. Ao perseguir seus sonhos eram desencorajadas, apontadas como loucas, julgadas como mulheres vulgares ou simplesmente negadas pelo sistema burocrático do Estado. Situações que até hoje se repetem.

A iluminação sobre o que se quer colocar o foco foi outro recurso significativo no filme. Luzes amarelas, verde, rosa e roxo são muito fortes nos ambientes noturnos e por isso a fotografia chama atenção. Sempre com o Rio de Janeiro ao fundo, a iluminação é algo que reverbera na memória sobre o filme porque é possível lembrar do sentimento da trama e da sua experiência pessoal através das cores.

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