Cineclube André Setaro e outros assuntos…

Por João Bertonie

Há certa diferença entre chegar atrasado num cinema e chegar atrasado no Cineclube André Setaro. Neste último, é preciso entrar com uma discrição adicional, tomando cuidado para não esbarrar nas cadeiras ou nas pernas das pessoas, algo particularmente difícil na apertada sala 7, da Faculdade de Comunicação (Facom/Ufba). Chegando atrasado no Cineclube André Setaro, há também a possibilidade de você perder os minutos iniciais de algum filme alternativo – e permanecer sem entender muita coisa nos minutos seguintes.

Na semana anterior, eu já tinha ido a esta mesma sala. Os rostos eram os mesmos: o ruivo de calças largas, o rapaz da barba marxista, o homem alto de cabelo grisalho que toda segunda-feira está com os olhos acinzentados fixos na tela de projeção. Este é o professor Leonardo Reis, espécie de fundador do clube semanal que leva o nome do crítico e professor André Setaro (1950 – 2014).

Leonardo, que é docente da área de cinema na Facom, explica que a ideia de criar o cineclube surgiu da necessidade de formar um repertório comum entre seus alunos. “O objetivo é militância”, afirma, sucinto e claro, ao falar sobre o compartilhamento de referências cinematográficas em seu grupo. Ele ainda diz que a sala 7 sedia as sessões porque é o “melhor espaço de projeções” da faculdade – e usa o termo “melhor” com uma entonação de quem diz “menos pior”.

Ao fim da exibição dos filmes “La jeteé” (1965) e “12 macacos” (“Twelve monkeys”, 1995) e da discussão sobre estas produções, quando Leonardo e seus monitores já estão “desmontando” a sala de projeção, comento sobre a ironia de o próprio André Setaro considerar a existência de cineclubes atualmente algo “desnecessário”. A isso, o professor apenas ri e responde: “É pra contradizer ele um pouco, né?”.

No dia seguinte, ao sair de outro clube de cinema, o cineclube Glauber Rocha, no Espaço Itaú de Cinema, em frente a praça Castro Alves, sou assaltado. Penso que faz sentido que Setaro acreditasse que cineclubes não sejam uma ideia tão bem-vinda aos nossos dias: com o passar do tempo, as ruas da cidade tornaram-se cada vez mais hostis e com o aumento da disponibilidade de acesso ao conteúdo audiovisual, é mais seguro que as pessoas prefiram assistir seus filmes em casa. Contudo a experiência de assistir um filme junto com outras pessoas, compartilhar ideias e repertório é muito mais interessante, o que talvez faça com que eu discorde da opinião de André Setaro.

O Cineclube André Setaro acontece todas as segundas-feiras, na sala 7. Se você for, tente não se atrasar.

Foto: Divulgação/12 Macacos

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