Das ruas às universidade: batalhas de rap ganham espaço na UFBA

Encontro reúne, todas as sextas-feiras, no campus de Ondina, dezenas de amantes das disputas de rima

Por Ícaro Lima

“Se tu ama essa cultura como eu amo essa cultura, grita: Hip-hop! Hip-hop!”. É assim que um apresentador convoca a galera para chegar junto a um pequeno palco montado em frente à Biblioteca Central da UFBA, em Ondina.

O evento é uma reunião de fãs de uma atividade musical popular em diversas partes do mundo: a batalha de rap. Esse tipo de encontro, que geralmente acontecem nas ruas de várias cidades do Brasil, inclusive Salvador, chegou recentemente à UFBA, mostrando que o caráter de espaço aberto da universidade continua de pé. São vários artistas, alguns começando agora, outros já com alguma carreira, que enxergam ali uma oportunidade de mostrar seu trabalho ou apenas “afiar” a habilidade da rima. 

 A “Batalha da UFBA” está apenas no começo, mas a cada semana a produção do evento busca inovar e oferecer ao público novas experiências que exaltem o hip-hop e suas diversas vertentes. 

A criação da batalha
Victor Leonardo, mais conhecido como “VL”, tem 21 anos, e é quem costuma fazer a convocatória no início do evento. Ele é integrante do grupo “A Banca BLR”, de Lauro de Freitas e um dos criadores da Batalha da UFBA. 

“A ideia surgiu a partir de um movimento de trazer a cultura de rua mais pra faculdade. A gente sabe que a faculdade é ainda mais um lugar de exclusão desse pessoal, e como eu participo da cultura hip-hop, já tô há quatro anos nesse rumo e amo o que faço, falei: ‘Ah, vamo juntar a galera, todo mundo que curte a parada e vamos fazer juntos!’”, relembra. 

VL destaca a importância da participação coletiva de sua equipe para que o evento continue de pé e a consciência do respeito necessário na produção e execução dos encontros: “Tem eu, a galera que acrescentou com marketing, que faz gráficos, tem a galera da fotografia… Então é todo um conjunto por uma causa, sempre exaltando o nosso movimento, sempre reafirmando. E a gente tenta excluir da batalha todo tipo de machismo, toda coisa que a gente não apóia. E pra gente isso é maravilhoso”, diz.

Desafios
Para VL, promover a cultura hip-hop numa instituição de ensino é algo importante e necessário, muito por conta dos olhares negativos ou desconhecimento que muitas pessoas têm quanto a esse estilo musical: 

“Eu acho que esse movimento é muito interessante também porque muitas pessoas que estão na faculdade não tem esse contato com a cultura de rua. Por exemplo, muita gente que chega aqui pra assistir a batalha, olha assim: ‘pô, quem é que tá ali, quem que está rimando? Então isso incentiva a galera a chegar, a olhar”, comenta.

Em pé, da esquerda para a direita: Alex Pantera, VL, Alexandre Marroquino, Daniel Guedes. Agachados: Renilton (camisa preta) e Mustache (camisa branca) (Foto: Divulgação)
Em pé, da esquerda para a direita: Alex Pantera, VL, Alexandre Marroquino, Daniel Guedes.
Agachados: Renilton (camisa preta) e Mustache (camisa branca)
(Foto: Divulgação)

Apesar de ser um tipo de encontro que vem das ruas e não exige grandes estruturas para acontecer, os organizadores da Batalha da UFBA ainda enfrentam alguns percalços na produção, mas, segundo VL, um setor específico da equipe voltada para isso consegue resolver tudo da melhor forma possível: “É um desafio. A gente hoje tá tentando fazer o progresso sempre, trazer uma banda, um mic [microfone] bom, uma caixa boa. Então, tem que ter liberação disso ou aquilo algumas vezes, mas aí a gente tem um setor e tudo consegue sair da melhor forma”, afirma.

Além desse grupo que costuma resolver os problemas logísticas da batalha, há várias outras pessoas que atuam em outros setores que sustentam o evento, como Daniel Guedes, que cuida do marketing, Jéssica Santos, responsável pela fotografia e Ogum, que é aluno de história da UFBA e foi quem chamou VL para criar a batalha. 

Como funciona
Para competir na Batalha da UFBA é simples, basta chegar, esperar as inscrições iniciarem e procurar algum dos organizadores: “A gente abre normalmente às 16h, e aí é pegando [os nomes], papel na mão, sem muito luxo, e a galera vem, chega na gente. E às vezes quando fecha e tem alguém querendo muito a gente fala: ‘hoje já fechou’. Mas se chegar mais um, a gente fecha a chave. Então não tem muito mistério”, explica VL.

Um dos recentes participantes é Odin MC, 19, que canta rap há três anos: “Participar foi muito gratificante. Tem um tempo que VL me chama para batalhar, aí eu estava com a sexta-feira livre e falei: “pô, vou chegar lá, mano. Dar um salve na batalha, rever a galera”, conta.

Ele avalia que a Batalha da UFBA tem um grande potencial de levar mais conhecimento para a galera que acompanha as apresentações: “A importância é expandir a cultura, abordar temas que o hip-hop prega, em primeiro lugar. Porque, querendo ou não, o hip-hop tem um posicionamento político. O rap é política. E isso ajuda também a abrir um pouco a mente da galera”, diz.

Odin considera que a permanência desse encontro é essencial e necessária para manter a cultura do hip-hop acesa: “E eu espero que continue tendo esse movimento na UFBA, entre outros diversos locais. Geralmente a gente faz em praças públicas e outros locais públicos, mas é interessante essa abordagem na faculdade, que a galera tem esse intervalo para se expressar”, finaliza. 

Importância
Quem também avalia como positivos os efeitos da Batalha da UFBA é uma própria integrante da equipe de produção que conhece bem o espaço da universidade. A fotógrafa Jéssica Santos, 24, é estudante do BI de Artes e ressalta que já era hora de ter esse tipo de evento no lugar que ela estuda.

“Demorou para ter uma batalha de rima aqui dentro da UFBA. Um dos preceitos da universidade é se conectar com o público externo e transformar esse conhecimento em algo bom para a sociedade”, diz.

Jéssica destaca também que o evento é uma nova oportunidade para pessoas que não costumam ter muito acesso ao ambiente universitário conseguir entrar em contato com esse lugar: “E a batalha de rima vem de um contexto da revolução da periferia, e o que a gente quer é que a periferia ocupe a universidade pública, que a galera da periferia venha pra cá, não só para a batalha, mas venha estudar, trabalhar, viver nesse espaço que é deles também e as pessoas restringem muito”, comemora.

Futuro
A Batalha da UFBA já conta com nove edições e acontece toda sexta-feira, às 16h, em frente à Biblioteca Universitária Reitor Macedo Costa, conhecida como Biblioteca Central, que fica na Praça das Artes, no campus de Ondina.

Quem quiser saber mais informações, além de acompanhar fotos e vídeos do evento, pode seguir a página da batalha no Instagram clicando aqui

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