As capivaras quebraram a internet! Estudante da UFBA é autor das “Crônicas de Wesley”

Uma entrevista com Wesley Silva, estudante de design, e criador das populares tirinhas do Facebook

Por Madson Souza

Algumas vezes a obra é muito mais reconhecida do que seu autor. É o caso do Frankestein, em que a criatura não tem nome, mas foi apelidada popularmente com a alcunha de seu criador, que com o tempo deixou de ser reconhecido. 

No caso das tirinhas, é normal que as pessoas não conheçam o responsável por suas risadas e para quem direcionam seus likes. Wesley Mercês Silva, criador do projeto “As crônicas de Wesley”, conta que começou para impressionar uma garota, hoje, sua esposa. 

Com o tempo, a ideia se desenvolveu e agora, possui quase 2 milhões de curtidas no Facebook, mais de 500 tirinhas, 2 livros publicados e a vitória na competição de arte para pratos da rede de restaurantes Spoleto. 

Nesta entrevista, vamos conversar sobre as crônicas do verdadeiro Wesley e sobre o Wesleyverso. 

Como surgiram “As crônicas de Wesley’?
Foi uma ideia de colégio. No começo, eu fazia piada com o pessoal e eles me viam sempre desenhando pelos cantos. Então, surgiu uma resenha interna e eles falaram: por que não faz uma tirinha sobre isso? Até então não tinha nenhum interesse em fazer. Só que aí conheci uma moça chamada Laíz, atualmente minha esposa. Queria muito impressionar ela. Lembrei da ideia dos meus amigos sobre fazer uma página de tirinhas e fiz pra mostrar que sabia desenhar, que era engraçado. Meus amigos foram conhecendo e curtindo. De repente, outras pessoas foram começando a curtir também. Quando deu 10 meses de página tinha um milhão de curtidas. Já não sabia o que tinha acontecido. Inclusive, Laíz ainda não tinha curtido a página. Depois de um milhão de pessoas ela curtiu a página, nos conhecemos mais, começamos a namorar e nos casamos. Tudo começou assim: eu tentando impressionar Laíz e a galera do colégio impulsionando. 

Quais são as inspirações para o conteúdo das tirinhas?
Acho que o cérebro é como se fosse um músculo. Todas as ideias que tenho partem do princípio que meu cérebro tá constantemente pensando em converter as coisas em tirinhas. Se eu deixei um prato cair no chão é tirinha, eu odiar lavar prato é uma tirinha, se algum amigo meu faz besteira perto de mim já é tirinha. Então, assim, acho que o cotidiano é a fonte de inspiração e alguma parte do meu cérebro converte isso em tirinhas. 

Como você define o estilo de humor das crônicas?
Acho que é um humor limpo. Gosto muito dessa definição, porque sempre me esforcei muito pra tentar não envolver palavrões, tentar não ofender as pessoas, por mais que acabe às vezes ofendendo. Já ofendi os asiáticos, sem querer, os negros, sem querer; por mais que me considere negro também. É sempre uma busca tentando agradar as pessoas, por isso considero um humor limpo. Tanto no sentido moral e ético, como no sentido de ser quem eu realmente sou. Não me forço muito pra fazer humor. É natural. 

Existe um Wesleyverso?
(risadas) Existe. E o Wesleyverso é um pouco maior do que o que tem nas crônicas. “As crônicas de Wesley” já tem muitas histórias escritas, cerca de 28 já cunhadas. Mas, não tenho toda a capacidade de produção ainda. Guardo elas com muito carinho esperando o dia em que tenha capacidade para produzir. Tenho histórias do Wesley do futuro, do passado, do presente, do Leandro, irmão do Wesley, da capivara do futuro. Várias histórias que fazem parte do universo. Por enquanto, não tenho capacidade de produzir tudo isso. 

Como você lida com outros artistas que vieram depois, com estilos semelhantes ao seu?
No começo fiquei muito frustrado porque achava que era o meu estilo, não queria que mexessem. Mas, fiz uma viagem missionária. Foi um hiato que fiz durante dois anos. Depois que retornei muitas pessoas me chamaram para contar que meu trabalho ajudou muito na produção artística deles, que se identificaram com o traço e conseguiram se encontrar através dele. Então, pra mim foi uma mudança de mente. Nesse momento, percebi que o que tava fazendo também tava incentivando outras pessoas a serem artistas. E que tava servindo de inspiração, que não perdi o estilo para outras pessoas, mas sim que elas desenvolveram estilos inspiradas no meu. Assim como meu estilo foi inspirado por outras pessoas. Então, é sempre um ciclo. Hoje eu fico muito feliz que pessoas foram inspiradas pelo estilo das crônicas. 


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RIP Luzinha.

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Qual o motivo dos dois anos de hiato?
Sempre quis ser missionário religioso e só poderia ser depois dos 18 anos. Quando alcancei a idade, fui. Esse período mudou minha vida. Só tive coragem de trabalhar com design depois desses 2 anos. Foi o período em que desconstruí meus pré-conceitos. Acho que me encontrei nesse período e foi muito bom para o meu lado artístico também. 

Como as pessoas lidam com aparecer nas tirinhas?
Como são inspirados em pessoas reais tento pegar da minha família e amigos e mudar um pouco. Antigamente, usava meus amigos mesmo, a galera que andava comigo. Mas tem uma questão de direitos autorais, né? Se um dia a série fica muito famosa e preciso produzir algo não posso usar a imagem da pessoa. Atualmente, uso a minha imagem, eu sou o personagem principal, o Wesley, e tem meu irmão, o Leandro. Acho que ele não vai me processar, porque ele é meu irmão, né? Nunca sabemos, mas esperamos que não. O restante dos personagens eu criei, o Capitão Brasil, que é inventado, um estereótipo; o Borracha também tento criar personagens bem fantasiosos. 

E as mudanças no seu trabalho e na internet, de 2013 pra cá?
Sinto que antigamente a internet era mais livre. As pessoas se sentem ofendidas por vários motivos. Cada um com seus próprios motivos. Tirinhas que postava antigamente, não podem mais ser postadas hoje. Por exemplo, teve uma tirinha do Wesley dando um presente pro saci, era um patinete. Satirizando a parte dele não poder usar um patinete porque ele só tem uma perna. Pessoas que não tem uma perna se sentiam ofendidas. Se fazia uma tirinha com alguém que não tinha pai, as pessoas que não tinham se sentiam ofendidas. Sempre alguém vai se sentir ofendido. Mas, tomamos um pouco mais de cuidado. Hoje, me controlo mais nesse sentido. 

Sobre a campanha de arrecadação no Catarse?
Foi para juntar dinheiro para comprar um equipamento em que pudesse trabalhar melhor com as tirinhas. As pessoas ajudaram, mas não consegui alcançar a meta que tinha. Por isso, tive alguns problemas depois. Quando vi que não ia alcançar falei com a galera: que ia produzir um pouco menos, mas assim que der eu volto. Sou muito grato aos meus fãs, eles são muito ativos. E sempre me ajudaram muito. Por mais que não tenha atingido a meta considero que foi um sucesso.

E a nova campanha no Apoia-se?
Depois do casamento e com a faculdade… a vida de adulto pesa um pouco. Gosto muito de produzir o material que produzo, mas as contas e coisas nos pedem para voltar à realidade. Sempre quis produzir as crônicas de maneira aberta, para que todos possam acessar e quem quiser contribuir, pode contribuir. O financiamento mensal ainda tá aberto. O objetivo era conseguir um bom financiamento e poder me dedicar de forma mais exclusiva. Como não consegui atingir a meta, a atenção às crônicas diminuiu um pouco. Agora, mais estável, tô começando a retornar ao ritmo normal e as crônicas ganhando um novo fôlego com o lançamento dos 2 livros e com as tirinhas exclusivas pra eles. 

Como a UFBA e o curso de design afetam o seu trabalho?
Sinto que tô aproveitando 100% do que a faculdade tá me oferecendo. Tenho aula durante o dia e quando chega a noite vou trabalhar e aplico o que aprendi mais cedo. Sinto que todo dia ganho um conhecimento novo para utilizar. 

Sobre o reconhecimento público. Como você lida?
A primeira vez eu fiquei vermelho por dentro. Por fora não dá, porque eu sou moreno. É uma satisfação maravilhosa! Nunca tive essa aspiração de ser reconhecido pelo meu rosto, mas gosto muito de ser reconhecido pelo meu trabalho. 


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Sempre pensei que vieram de alguma língua antiga de Nárnia, mas aí Tio Val de Mort me explicou de onde vem.

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Qual o futuro para “As crônicas de Wesley”?
Quero que elas cresçam e se tornem uma coletânea de histórias. Sinto que são histórias sinceras que fui cultivando ao longo do tempo. Nada que fiz foi para ser publicado. Isso é importante. O futuro das crônicas é a animação e tô trabalhando muito pra isso. Quem sabe um dia abrir vagar para que outras pessoas possam me ajudar. 

O que você faz para manter seu trabalho relevante na internet?
6tAcho que “As crônicas de Wesley” tiveram um golpe de sorte muito grande. Porque no final de 2013, começou a surgir essas páginas de conteúdo próprio. As pessoas curtiam e era uma coisa nova, elas começaram a se identificar. Acho que isso é o fator principal. As pessoas lembram das crônicas como algo já das antigas, uma memória afetiva. Não é nada que eu faço. Tanto que quando fiquei em hiato achei que ia voltar e ninguém ia lembrar de mim, porque a internet corre muito rápido. Depois que voltei tudo tinha mudado, mas as crônicas tinham 300 mil pessoas a mais. As pessoas gostam e elas que são a alma do trabalho. 

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