Facom recebe Mr. Armeng para discutir arte, cultura e identidade

Autor da música “Eu vim de lá”, escrita para o documentário “Menino Joel” sobre a criança morta no Nordeste de Amaralina, Mr. Armeng debateu sobre a produção artística das comunidades que são marginalizadas

*Por Gustavo Salgado

A Faculdade de Comunicação da UFBA (Facom) recebeu nessa sexta-feira, 7 de fevereiro, a visita do músico Mr. Armeng – o rapper foi o convidado da semana para a aula aberta da disciplina Comunicação e Arte (COM315), sob orientação do professor André Santana. O tema central do encontro, que aconteceu no auditório da Faculdade, foi a análise da música “Eu vim de lá”, de autoria de Mr. Armeng, que deu início a uma mesa redonda entre o professor e os estudantes da disciplina, o artista e visitantes.

“Eu vim de lá”, música do rapper Mr. Armeng, foi criada para integrar o documentário “Menino Joel” (criança morta no Nordeste de Amaralina em 2010) e participa do cenário local da música contemporânea de caráter crítico social em relação às realidades urbanas tensionadas e regidas por violência, preconceito e intolerância. Além da canção, o rapper elaborou para a música um videoclipe, cuja estética marginal lhe confere uma poética singular. A encenação utiliza elementos do cotidiano do Nordeste de Amaralina e os ressignifica ao desvinculá-los do imaginário preconceituoso que se tem do bairro.

Menino Joel No dia 22 de novembro de 2010, Joel, um garoto de 10 anos, é baleado dentro de casa enquanto se preparava para dormir. A casa do garoto, no Nordeste de Amaralina, foi invadida por nove oficiais da Polícia Militar em uma ação no bairro.

Joel, assim como muitos, foi mais uma vítima da violência que atinge principalmente os bairros periféricos e marginalizados de Salvador, ao lado da opressão e por vezes do abuso de poder praticado por parte da polícia. Em 2013, no dia 13 de junho, outro homem é morto no Nordeste de Amaralina. Carlos Alberto Conceição, 22 anos, era primo de Joel e veio a óbito durante uma abordagem policial, quando ia encontrar amigos em um dia de folga.

Improviso, gambiarra e Armeng Maurício Sousa, 30 anos, apelidou-se como Armeng porque no início de sua carreira artística enfrentou diversas dificuldades técnicas e financeiras – então era tudo “armengado”: expressão baiana para se referir a algo improvisado.

Morador do Nordeste de Amaralina desde os 10 anos, de seu pai, Guiguio do Ilê Ayê, ganhou um computador em que ele criava as batidas do rap. Em relação ao Nordeste, o rapper diz que tem uma ligação muito forte com o bairro, pois foi graças a ele que descobriu o movimento hip hop.

Foto: Reprodução Sony
Em 2013, o rapper foi o vencedor do programa Breakout Brasil, e fechou contrato com a gravadora Sony.
Foto: Reprodução canal Sony Spin

O músico defende que o lugar em que reside é um celeiro cultural, e que se sente no compromisso de mostrar isso para as pessoas, já que a maioria só conhece o lado ruim, através dos noticiários que costumam divulgar a violência do bairro.

Característica fundamental e mais do que recorrente, diretamente presente no discurso de Armeng é a valorização e visibilidade ao Nordeste de Amaralina. O artista expõe os anseios de toda uma comunidade por uma melhor realidade – do simples atendimento às necessidades básicas, como infraestrutura adequada para as escolas, e o acesso ao lazer, até através da arte buscar uma vida menos oprimida, utilizando a cultura como ferramenta de combate social a uma condição imposta de desigualdade.

Narrativa visual O videoclipe da música “Eu vim de lá” apresenta-se como uma construção de cenas do cotidiano. Logo no início do vídeo uma jovem lixando suas unhas  inicia a marcação rítmica da música. Em outra cena, um grupo de jovens sorridentes bate palmas e compõe a marcação inaugurada pela lixa de unha. Um homem, centrado em seu treino de Boxe (o que pode ser interpretado como metáfora do exercício diário de luta contra as dificuldades), golpeia um saco de pancada, acompanhando o compasso.

O artista empenha-se em desvincular do bairro o estereótipo de ambiente puramente violento e composto por uma sociedade criminosa. Esse esforço é perceptível através dos versos: Onde o governo não vem / Muita polícia / Aqui que tem gente do bem / Que não deve nada a ninguém / Sem medo de vencer / E de cabeça erguida / […]  E a polícia respeite / Os nossos pais de família / Aqui tem médico / Cantor e compositor / Percussionista, advogado, e ator / Mestre de capoeira / Mãe de Santo, enfermeira / Trabalhador operário / De segunda a segunda-feira.

Sob a orientação do Professor André Santana, Comunicação e Arte tem trazido artistas, geralmente com forte engajamento social, com o intuito de diminuir as fronteiras entre a Universidade e a sociedade e contribuir para a formação cidadã dos universitários.

Assista ao clipe Vem Cá:

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