Quais os impactos da pandemia para a economia criativa?

Mudanças de abordagem e a necessidade de políticas públicas para o setor se tornaram as questões principais

Por Laisa Gama*

Ninguém escapou do emaranhado de problemas que foi 2020. Seja do estudante até o trabalhador, todos de alguma forma foram afetados com o decorrer da pandemia de Covid-19. Os setores da economia criativa não foram exceção. Segundo pesquisa do Observatório de Economia Criativa da Bahia (OBEC-BA), cerca de 83,7% dos trabalhadores e organizações do meio criativo afirmaram que foram muito afetados com a pandemia.

Divulgada em setembro deste ano, a pesquisa contou com dados recolhidos entre os meses de março e julho. Foram obtidas 2.608 respostas, sendo 1.639 de indivíduos e somente 969 de organizações. Ela veio com um intuito de registrar, analisar e monitorar as consequências do coronavírus nos setores artísticos, culturais e criativos. Pois foi um momento de mudanças nas atitudes para que a renda dos diversos envolvidos continuasse, visto que o auxílio à essas áreas chegou mais tarde.

A necessidade de se manter
Embora tenha tido diversas dificuldades com a manutenção de seus trabalhos, Leonardo Costa, coordenador do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura (CULT/UFBA) e pesquisador da OBEC-BA, fala que mesmo assim, nem tudo parou. Algumas áreas buscaram se adaptar e criar novas formas e modelos de presença.

Luan tentou adaptar sua profissão à pandemia (foto: acervo pessoal)
Luan tentou adaptar sua profissão à pandemia (foto: acervo pessoal)

Foi o que Luan Pugliesi, produtor musical e DJ, tentou fazer. Estudante de Produção Cultural na Facom, com a pandemia seu trabalho como produtor se tornou muito mais ativo, devido a não poder se apresentar em eventos. Ele tentou vender serviços de mixagem e masterização, mas como o meio não anda tão ativo e principalmente por conta da falta do dinheiro nessa área, poucas pessoas compram o produto. Antes da pandemia, ele trabalhava, principalmente, com apresentação de eventos.

“O impacto do covid foi algo devastador no setor de eventos no geral. Não somente no campo da música, mas no todo. Pois muitos produtores e artistas dependem exclusivamente disso e com o corona, muitos trabalhadores perderam suas fontes de renda”, acrescenta Luan. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Sebrae, cerca de 98% do setor de eventos foi afetado com a pandemia.

Apoio financeiro
Além disso, muitas pessoas buscam trabalhar de maneira isolada. Segundo a pesquisa da OBEC, menos da metade dos entrevistados disseram estar ligados a algum tipo de associação ou sindicato. Para Leonardo, o fato disso acontecer pode fazer com que setores que trabalhem de maneira isolada  tendam a mais dificuldades no processo de enfrentar os problemas. “A prática do associativismo pode auxiliar no enfrentamento de algumas situações, como na criação das demandas coletivas de apoio do poder público para mitigar os efeitos da crise”, completa ele.

O país tem sérios problemas no campo de incentivos fiscais e planos para crises principalmente para o setor criativo devido a uma instabilidade e ausência de políticas culturais, diz Leonardo. O que é se agrava pelo fato de cada vez mais as atividades culturais e criativas participarem do PIB brasileiro. Em 2017, cerca de 2,64% era equivalente à economia criativa, de acordo a levantamento da Federação de Indústria do Rio de Janeiro (Firjan).

Albino Rubim teme pela situação atual das políticas culturais (foto: acervo pessoal)
Albino Rubim teme pela situação atual das políticas culturais (foto: acervo pessoal)

O pós-doutor em Políticas Culturais e docente do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade, Antônio Rubim, diz que para quem trabalha principalmente com a cultura, a situação é muito grave. As políticas públicas criadas a partir da gestão de Gilberto Gil  no Ministério da Cultura estão sendo sistematicamente destruídas. Para ele, a cultura está sendo asfixiada financeiramente. “Temos um (des)governo que colocou a cultura, a educação, as ciências, as artes e as universidades públicas como inimigos”.

Para tentar controlar os efeitos negativos que foram se propagando no meio cultural da economia, a lei Aldir Blanc entrou em vigor em agosto deste ano na Bahia, como uma medida emergencial a quem trabalha no meio. Ficou definido um pagamento de 3 parcelas emergenciais num valor de R$600 a partir do momento em que entrasse em vigor. Cerca de 25 mil já foram inscritos. O cadastro para recebimento do auxílio abriu novamente no dia 6 de novembro até dia 15. A reabertura se deu devido a demanda de  trabalhadores de vários municípios por conta de não terem feito o cadastro dentro do período, assim como o fato de haver disponibilidade de recursos, segundo a assessoria da Secretaria da Cultura do Estado.

Rubim vê positivamente a chegada da lei emergencial. Se com a pandemia, não houvesse tido a mobilização e conquista, poderia estar sendo muito pior. Mas é preciso ter cuidado pois a lei tem seus limites. “Uma das grandes importâncias da lei, além do auxílio financeiro emergencial, foi a animação política do campo da cultura. Espero que o campo cultural e os setores democráticos e de esquerda da sociedade sejam capazes de continuar a mobilização e luta por políticas culturais continuadas e não emergenciais”, ressalta ele.

Muito tempo online
O isolamento social fez com milhões de pessoas no mundo inteiro tivessem que ficar em casa. Para quem podia, a casa virou lugar de lazer e trabalho. E passar muito tempo em casa faz com que as pessoas procurem formas de se entreter. Por conta disso que logo no pico da pandemia, redes sociais como Instagram, Facebook e Whatsapp tiveram um crescimento em torno de 40% de acordo com dados publicados pela Kantar em março deste ano.

Justamente por isso, quem já trabalhava e investia nas mídias sociais observou um maior engajamento com o público. É o caso da ilustradora e designer freelancer Tainá Anunciação, conhecida no meio artístico como Folha de Louro. Estudante de Artes na UFBA, ela começou a profissionalizar esse trabalho no fim do ano passado e com a chegada de 2020, acredita que pelo fato do seu público precisar ficar mais em casa, acabou tendo uma melhora na visibilidade.

E ficar em casa trouxe para ela uma maior oportunidade de investir. Eu acabo produzindo até mais, a depender do momento em que estou. Como às vezes eu tenho mais tempo em casa, consigo produzir mais material pra ter engajamento nas redes sociais”.

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