Jovens da Escola de Teatro da UFBA se reúnem contra o racismo e criam o PRETato

A iniciativa  é inspirada no projeto “Ato de 4” também formado por alunos da Escola de Teatro

Por Kelven Figueiredo e Lucas Arraz

“Levar a cena preta para a Escola de Teatro”. Esse é o objetivo do PRETato, um projeto que todas as terças-feiras, a partir das 19h, apresenta quatro cenas distintas cuja equipe de produção e encenação é composta por pessoas negras.  O evento acontece na Sala V da Escola de Teatro e foi idealizado pela a  Organização Dandara Gusmão, um coletivo que surgiu em agosto de 2016 com o objetivo de amenizar os incômodos sobre o racismo institucionalizado e naturalizado na Escola de Teatro.

A falta de artistas de pele preta retinta nos espetáculos da Companhia da Escola de Teatro da UFBA é apontada pelos membros da Organização Dandara Gusmão como a motivação para criação do projeto.  O evento é  aberto ao público em geral e possui entrada gratuita, mas todo o espetáculo é feito por negras e negros. Para apresentar trabalhos, não existe seleção de elenco, todas as pessoas pretas que desejarem podem participar. Devem apenas inscrever a proposta através de formulário online

Coletivo Dandara Gusmão é formados por alunos da UFBA e de outras instituições
Coletivo Dandara Gusmão é formados por alunos da UFBA e de outras instituições

Segundo a Organização, o maior objetivo do projeto é “levar a cena preta para a Escola de Teatro da UFBA, inexistente em muitas áreas da mesma”. Além disso é uma preocupação dos alunos “trazer a comunidade externa para dentro da Escola”. O grupo explica que, por tratar-se de um espaço público, este deve garantir um retorno em serviços para a sociedade. Outro objetivo do projeto é “dar a oportunidade de artistas e grupos que não são da Escola de Teatro experimentarem seus trabalhos numa caixa cênica, debater todas as formas de racismo existentes no Brasil e criar condições para que nosso público possa refletir sobre as situações que são apontadas”.

Os organizadores do PRETato resolveram se reunir após uma conversa com os alunos coordenadores do Ato de 4. Na ocasião, eles solicitaram que em novembro de 2016, fosse realizado o primeiro “Ato de 4 Preto”, uma referência ao Mês da Consciência Negra. Esta seria a primeira vez em 20 anos do projeto que a programação de novembro estaria inteiramente voltada para a causa. Por conta da negativa, o PRETato foi pensado e construído. “Com base no “Ato de 4”, mas com a nossa cara, do nosso jeito”, conta os organizadores do PRETato.

Apesar de ter inspiração no projeto os coordenadores garantem que as iniciativas se diferem “muuuito”. Enquanto o “Ato de 4” é gerido exclusivamente por estudantes da UFBA, o PRETato reserva duas vagas paras artistas ou grupos de fora da Universidade e duas vagas para artistas ou estudantes da Instituição. Porém a proposta é que este seja um espaço exclusivo para a encenação de cenas pretas, que tratem da demanda, história e ancestralidade do povo negro, africanos e africanas da diáspora.

Muitos obstáculos foram vencidos para que o projeto iniciasse. “A aquisição permanente da pauta da Sala V, laboratório cênico, faixas e cartazes para divulgação, organização e limpeza, iluminação e entre outros foram algumas das dificuldades que tivemos”, citam os criadores do evento.

Um fato curioso sobre o PRETato é que os membros da Organização se denominam Dandara Gusmão. E isso tem uma explicação: “nos denominamos Dandara Gusmão porque trazemos como inspiração e referência a luta e ao combate de Dandara, representação da força e coragem da mulher preta africana, e Gusmão como o primeiro ator formado pela Escola de Teatro da UFBA que teve uma trajetória riquíssima que nos ensina, inspira e a nossa instituição ignora veementemente.”.

Quando questionados sobre o mercado das artes cênicas em Salvador, o coletivo afirma que “o cenário atual para qualquer artista preto e preta é de pura subserviência aos ditames da cultura branca impostas social e artisticamente para esses artistas que invariavelmente encenam personagens estereotipados e sem história”. Outra queixa feita é que  as atrizes e atores negras e negros são guiados para um teatro comercial que folcloriza sua ancestralidade, que não os levanta para a luta e os coloca como “dignos de pena” com um papel de menor relevância.

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