Monique Evelle lança seu primeiro livro: “Sou mulher negra e não estou falando de racismo, estou falando de negócios”

Em entrevista, Monique fala sobre a experiência de escrever um livro e a quebra de expectativa sobre o seu lugar

Por Luciana Freire

Aos oito anos, Monique Evelle ganhou de presente dos pais um livro, e assim nasceu o sonho de ser professora, depois escritora e jornalista. Aos 25 anos, já está pensando quais são seus novos sonhos. Jornalista, empresária e ativista, Monique está lançando o seu primeiro livro “Empreendedorismo Feminino – Olhar Estratégico sem Romantismo”, que é um ‘sincericídio’ sobre o mundo dos negócios, caminhos, dificuldades, frustrações e acertos.

Monique criou o projeto Desabafo Social com 16 anos, já foi repórter no programa Profissão Repórter, da Rede Globo, e finalista do Troféu Mulher Imprensa 2018. Hoje é sócia de outros projetos como Agência Responsa e Sharp Inteligência Cultural. Com uma longa jornada por esse universo, ela decidiu escrever seu primeiro livro. O lançamento foi durante a Virada Sustentável, em Salvador, na semana passada. Em entrevista para a Agenda, Monique fala sobre a experiência de escrever um livro, a quebra de paradigma como pessoa negra falando sobre negócios, além de sua passagem pela UFBA cursando o Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades.

Como foi o processo de escrever um livro e os desafios de selecionar o conteúdo?
É que nem música, criar um álbum, nunca está pronto, nunca é o suficiente. Algo interessante é que eu fiquei três meses escrevendo, eu coloquei tudo que eu achava. Eu vomitei palavras, dentro desse universo do empreendedorismo do que eu acreditava naquele momento. Eu não alterei, poderia até, mas a proposta inicial que estava na minha cabeça para começar um primeiro livro era de colocar tudo que eu acho. O livro é um sincericídio. Isso porque ele toca em assuntos que as pessoas, especialmente os empreendedores, não gostam de falar abertamente sobre esse meio.

(Foto: Divulgação)
(Foto: Divulgação)

Então você diria que esse é o diferencial do seu livro sobre outros livros de empreendedorismo?
Por isso que o nome é ‘um olhar estratégico sem romantismo’, porque eu tenho um problema com isso. As pessoas adoram um TED. Muita gente que sobe no palco de qualquer evento de empreendedorismo, às vezes, sim, criou alguma coisa, mas não significa que funciona. Ou criou em algum momento da vida e não tá funcionando mais hoje. Eles adoram continuar alimentando esse ego de “sou um empreendedor, sou incrível”. Eu acho que isso é um equívoco (ficar vendendo o que não existe). No livro, eu falo muito de como é que a gente sai desse lugar do ego – porque é muito legal estar no jornal, muito legal estar na revista, mas não cria nada que funciona -, em como não cair nessa armadilha.

Já abro o livro dizendo que vou cometer um sincericídio, alguns capítulos você vai me odiar, mas estou preparada. A maioria dos livros de empreendedores são de autoajuda e eu não estou nesse lugar na minha vida, eu não sou psicóloga. Acho que eu fui a mais sincera possível dentro desse universo. Claro que relendo eu alteraria algumas coisas, mas aí já seria um outro livro.

E está vindo aí um novo livro?
Eu estava escrevendo dois ao mesmo tempo, né? Será um mais tranquilo, só que mais denso, com mais dados, mais história, ainda no universo dos negócios, tendo como contexto essa minha ida ao Vale do Silício.

O livro fala sobre empreendedorismo feminino porque é baseado nas suas vivências. Foi natural ou foi por perceber uma lacuna de um conteúdo com esse foco?
Sim, porque sou eu, mas faz parte da Coleção Reflete o Feminino, com várias autoras. Tem uma parada que, tudo bem, poderia ser só empreendedorismo e tal, mas é interessante falar de mulher pra mulher: “é pra você. Eu não quero que você se ferre, por favor”. Eu entendo que os homens vão ler o livro por aí e nele eu até falo: “eu não sei se você é homem ou mulher, gorda, magra, preta, branca, eu sei quem eu sou e a partir disso a gente conversa”. Tentei colocar as palavras no feminino também, foi um exercício ótimo porque a língua portuguesa é totalmente masculina. Pode até ter passado algumas, mas se se sentem contemplados pelo “todos” que se sintam contemplados pelo “todas”. Outra coisa é que eu sou mulher e também sou negra, não estou falando de gênero ou racismo, estou falando de negócios.

E sobre a sua jornada e formação, você estudou na UFBA no Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades. Como foi sua experiência na universidade?
Acho o BI muito interessante porque, primeiro eu fiz engenharia ambiental descobri que não era o que eu queria, depois fui para direito, também  percebi que não era o que eu queria, eu falei “não sei o que vou fazer da minha vida”. O BI dá a possibilidade de você vivenciar diversas linguagens né, eu criei o projeto Desabafo Social com 16 anos, antes da faculdade, então eu estava vivendo a vida, viajando, palestrando, criando coisas. Não era um curso de Direito que conseguia ter um diálogo mais aberto com as coisas da vida, Engenharia então piorou, o BI conseguiu de certa forma. O que eu escrevia ou discutia em outro lugares eu complementava na sala de aula

Claro que no BI tem esse pré-conceito, porque tem um recorte de classe e racial sobre quem está entrando na universidade pelo BI.  Mas as pessoas adoram as universidades de fora né, Stanford e Harvard por exemplo, e o BI é o modelo que mais se assemelha a essas universidades. Se você valoriza essas faculdades e não valoriza dentro de casa, então tá fazendo o quê? 

A universidade é um ambiente hostil, principalmente para pretos. Cada um tem um lado da trincheira. O meu não é entrar com um partido, mas eu entendo quem esteja e tem que tá mesmo. Eu faço ativismo com dinheiro, eu contrato pessoas, cada um tem seu rolê. E nesse sentido foi um choque pra mim estar na universidade, eu pensar desse jeito e estar lidando com a militância de partido. Me formei em 2016 e não consegui pegar meu diploma até hoje, não tive tempo, acredita? 

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