Sarau faz homenagem ao poeta de aço

Carlos Drummond de Andrade é homenageado no primeiro Sarau Prosa e Poesia de 2014

*Por Débora Rezende | Fotos de Lorena Brandão Carneiro – colaboração para a Agenda Arte e Cultura

A primeira edição do Sarau Prosa e Poesia de 2014 aconteceu no sábado, 25 de janeiro, no Palacete das Artes. O homenageado da vez foi o poeta itabirense Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987). O evento, que contou com a participação de poetas, músicos e escritores como Mariana Paiva, Nílsol Galvão, Aleilton Fonseca e Fábio Haendel, aliou música e literatura para entreter um público que ultrapassou a margem das cem pessoas esperadas para o evento.

O Sarau Prosa e Poesia, que teve sua 17ª edição, surgiu da iniciativa de criar um espaço para fazer poesia e falar dela. Os poetas Nílson Galvão e Kátia Borges já tinham sido convidados para um projeto da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB) da área de literatura e pensaram em dar continuidade à proposta, incrementando-a com a música de Fábio Haendel, já conhecida por Kátia. “A partir dessa primeira performance e da reação do público ao evento, da leitura, dos trabalhos autorais e da música do Fábio, as pessoas falavam ‘vocês não podem parar’”, conta Lígia Benigno, produtora do evento desde sua reunião inicial. A boa recepção do público e a temática do evento despertaram também o interesse da jornalista e escritora Mariana Paiva, que entrou para a equipe logo depois. “É importante que a gente tenha esse espaço, o Sarau, como uma pausa da realidade”, explica Mariana sobre a relevância do evento. Atualmente, a poeta Kátia Borges não faz mais parte do Sarau, se dedicando a projetos solo.

Segundo a produtora do Sarau Prosa e Poesia, a intenção do projeto é que ele não ficasse ligado apenas aos amigos e à equipe: o ideal era que as edições tivessem retorno em presença de público. “Tínhamos muito medo de ficarmos apenas nós e nossos amigos. Queríamos um lugar pequeno e aconchegante, porque imaginamos: poesia… Quem é que vai se interessar?”, conta Lígia.

Fábio Haendel e Lígia Benigno. Foto: Lorena Brandão
Fábio Haendel e Lígia Benigno.
Foto: Lorena Brandão

O sarau teve suas primeiras edições no antigo Café & Cognac, no Rio Vermelho, passou também pelo espaço cultural do restaurante Casa de Tereza, sempre com a média de público superando as expectativas dos organizadores do evento, até receber um convite do Palacete das Artes para realizar o projeto no local. Ali, em meio ao clima de tranquilidade do Palacete, o Sarau Prosa e Poesia se juntou ao projeto Trocando Palavras – que funciona à base de troca e doação de obras literárias –, consolidando assim a proposta de uma tarde de literatura e música ao cenário cultural de Salvador.

A edição do sábado, 25, começou às 14h com o Trocando Palavras. Ali, o público tinha a possibilidade de entregar um livro e receber dois: um à base de troca entre os outros títulos levados pelos demais leitores, e outro doado pelo projeto, geralmente obras que não são facilmente encontrados nas livrarias convencionais. “Temos, na doação, livros de autores baianos que são raramente encontrados fora daqui, além de obras custeadas pelo Governo Federal”, explica Mona Nascimento, monitora do Trocando Palavras.

Grande parte dos participantes do Sarau frequenta o projeto Trocando Palavras, e vice-versa. Foto: Lorena Brandão
Grande parte dos participantes do Sarau frequenta o projeto Trocando Palavras, e vice-versa. Foto: Lorena Brandão

Um evento alimentava o outro: o público que estava inicialmente interessado na troca de livros muitas vezes acaba ficando para o Sarau, ao passo que os que vinham apenas pela poesia acabavam se interessando pelos títulos disponibilizados para a troca. “Eu vi os dois eventos e me interessei”, conta o estudante de Direito Leonel Araújo, 23. “Sempre que tem uma coisa diferente assim eu acho que quem gosta tem que vir prestigiar”, diz.

A escolha do poeta homenageado pelo Sarau Prosa e Poesia também foi um atrativo para o público. A popularidade de Carlos Drummond de Andrade atinge antigos e novos amantes da poesia, que foram ao Palacete das Artes esperando ouvir os clássicos do poeta e escritor itabirense. Ao todo foram lidos treze poemas de Drummond, mesclados entre os clássicos e os poemas menos conhecidos. Lidos pelos poetas Nílson Galvão e Mariana Paiva, poemas como “Quadrilha” e “Mãos dadas” foram aplaudidos de pé pelos presentes no Sarau. “Drummond é o meu poeta favorito”, diz Leonel Araújo sobre a escolha do homenageado do evento. “Não podia perder”, finaliza.

A clara simpatia do público pelo autor mineiro não foi o único motivo que levou Drummond a ser homenageado no primeiro Sarau Prosa e Poesia de 2014. Segundo Mariana Paiva, que, além de realizar a leitura de seus poemas autorais e das obras do homenageado, é uma das organizadoras do evento, “Drummond era uma ideia antiga. Estávamos esperando uma ocasião especial. Começar um ano novo, um ciclo novo, é essa a ocasião”, diz. Além disso, a produtora Lígia Benigno explica que os atos de vandalismo praticados contra a estátua de Carlos Drummond e Andrade, no Rio de Janeiro, em dezembro de 2013, foram um incentivo à homenagem. “Por conta do acontecido lá no Rio, aquela coisa bárbara que fizeram com a estátua de Drummond, e já havia um tempo que queríamos homenageá-lo, pensamos: ‘agora é o momento’”, relata.

Nílson Galvão, Mariana Paiva e Fábio Haendel compartilham palco, poesia e música durante o Sarau. Foto: Lorena Brandão
Nílson Galvão, Mariana Paiva e Fábio Haendel compartilham palco, poesia e música durante o Sarau. Foto: Lorena Brandão

Convidado especial O Sarau Prosa e Poesia contou ainda com a presença do poeta Aleilton Fonseca, que faz das letras o seu mundo há 30 anos. Poeta, escritor e professor de literatura, Fonseca conta como escreveu seu primeiro livro de poesia aos 21 anos de idade. “Movimento de Sondagem”, seu título de estreia, recebeu uma carta de incentivo assinada pelo próprio Drummond. Fonseca, que começou seu primeiro livro de poesia com uma citação do poeta itabirense (“A poesia é minha cachaça / Todo mundo tem sua cachaça”), enviou uma versão da obra para alguns escritores já consagrados, estando Drummond entre eles. Quando recebeu a resposta do mineiro ao livro enviado, Fonseca relembra que “queria correr atrás do carteiro para lhe dar um abraço, mas ele já tinha ido embora”.

Aleilton Fonseca foi o convidado especial da 17a. edição do Sarau Prosa e Poesia. Foto: Lorena Brandão
Aleilton Fonseca foi o convidado especial da 17a. edição do Sarau Prosa e Poesia. Foto: Lorena Brandão

Além da música, das leituras da obra do homenageado e da poesia de Aleilton Fonseca, o Sarau contou ainda com a música instrumental de Estevam Dantas, as leituras das obras autorais de Nílson Galvão e Mariana Paiva, além de um momento de microfone aberto. Segundo Lígia Benigno, produtora do Sarau, esse é um espaço de interação, no qual as pessoas que compareceram ao evento têm a oportunidade de subir ao palco e ler seus próprios versos. “A gente não faz seleção nenhuma, não tem curadoria, basta a pessoa trazer sua poesia”, explica.

A proposta de trazer poesia, música e literatura às tardes de Salvador incrementa o cenário cultural alternativo da cidade, oferecendo opções àqueles que almejam por programações mais diversas. “Sempre gostei de poesia, e eu acho que esses eventos são extremamente importantes para a cultura da cidade”, diz Ana Bianchi, socióloga e antropóloga que esteve presente no Sarau Prosa e Poesia. “Esses eventos são raros. Acho que o mundo está muito escuro, e a poesia é luz”, finaliza.

O Sarau Prosa e Poesia é uma iniciativa custeada pelos próprios organizadores do evento, com o apoio estrutural do Palacete das Artes. O evento acontece mensalmente, aliado ao Trocando Palavras, trazendo convidados especiais e, segundo os organizadores do evento, homenagens tanto a escritores renomados como autores menos conhecidos pelo público.

Como de costume, a presença do público superou as expectativas da produção do evento. Foto: Lorena Brandão
Como de costume, a presença do público superou as expectativas da produção do evento. Foto: Lorena Brandão

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