Palestra em Salvador discute a relação do público com o teatro documentário

Evento no Teatro Sesc-Senac Pelourinho contou com a presença do professor Luiz Marfuz, da ETUFBA, além do diretor teatral Nelson Baskerville e do ator Marcos Felipe. Peça sobre a vida do irmão de Baskerville serviu de pano de fundo para a discussão.

*Por Guilherme Reis

“O ‘Luis Antonio’ (Gabriela) está mexendo em várias esferas que fazem o público querer levá-lo para casa e não descartar no dia seguinte”. A declaração, do diretor teatral Nelson Baskerville, reflete sobre a peça baseada na vida de seu irmão – Luis Antonio –, que serviu de pano de fundo da palestra que discutiu, no último dia 06 de julho, o teatro documentário. O evento, que aconteceu no Teatro Sesc-Senac Pelourinho, também contou com a presença do professor da Escola de Teatro da Ufba, Luiz Marfuz e de um dos atores da peça, Marcos Felipe.

A peça citada por Baskerville, também dirigida por ele, esteve em cartaz durante os dias 4, 5 e 6 desse mês. O espetáculo estreou em São Paulo, no ano de 2011, e já contabilizou mais de 280 apresentações em várias cidades do Brasil. A história é baseada na vida do travesti Luis Antonio “Gabriela”, irmão de Baskerville, e já foi reconhecida com o Prêmio Shell (Melhor Direção) e o APCA (melhor espetáculo de 2011). “’Luis Antonio (Gabriela)’ é sujo, não há limpeza nessa história. É encontrar a sublimação sobre uma tragédia, uma pessoa que está buscando parte da sua história – a minha irmã”, revela o diretor.

Entre as várias questões levantadas na palestra, uma das mais discutidas foi o papel que o teatro exerce atualmente na sociedade brasileira. Para Baskerville, o teatro dramático perdeu a comunicação com a plateia. “A ficção do teatro é tão distante do público que as pessoas não sabem o que está acontecendo em cima do palco”, analisa. Foi assim que surgiu a ideia da peça, “numa época que viu gays sendo atacados com lâmpadas na Avenida Paulista e o Congresso fala em uma ‘cura gay’”.

Ele acredita que a história tem a capacidade de provocar um sentimento de identificação no público, devido à atualidade do tema e dos conflitos humanos abordados. “A maior parte da nossa população está insatisfeita e isso passa pelo viés da cultura. Além disso, a dramaturgia sempre quis estar à frente dos movimentos e escutar os anseios da população”, diz o diretor.

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TEATRO DOCUMENTÁRIO “Luis Antonio – Gabriela” pertence à vertente do chamado teatro documentário, dono de ampla popularidade na Europa e na Argentina, e que, nos últimos anos, vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil. Baseado em notícias de jornal, documentos diversos, depoimentos e histórias de pessoas comuns, esse gênero busca estabelecer uma maior proximidade com o público. “O documentário pode ou não estabelecer uma proximidade com o público desde que penetre em quem vê. É o caso da encenação de Nelson Baskerville, Luiz Antonio-Gabriela. O que se vê no espaço cênico é bem mais que uma fatia da vida, um documento. A proximidade está no tratamento dado ao material”, analisa Raimundo Matos, professor da Escola de Teatro da Ufba.

O espetáculo de Baskerville, por exemplo, é baseado na história do seu irmão mais velho, Luis Antonio, que viveu em Santos até os 30 anos de idade. Rejeitado pela família, principalmente pelo pai, que o espancava com uma vara de pescar, mudou-se para a Espanha, onde assumiu a identidade de Gabriela e protagonizou shows em várias boates. Em 2006, foi vitimado pelo vírus da Aids. Quando perguntado sobre o porquê de remexer em um assunto tão delicado e pessoal, Baskerville declara: “O teatro sublima e facilita a realidade. Eu precisava externalizar aquele mundo interno. O teatro apareceu como necessidade”, conclui.

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