Jogadores baianos de xadrez ganham destaque na modalidade e desafiam padrão social do esporte

Entre março e junho, enxadristas participam do Circuito de Xadrez Pinto Paiva

Por: Maria de Moura

Quando se fala da Bahia, é comum pensar em praias, música e culinária. Já quando se fala em jogador de xadrez, é possível que venha à mente um homem, branco e, às vezes, até estrangeiro. No entanto, jogadores baianos que vêm ganhando destaque no esporte desafiam o padrão social associado à modalidade.

Entre março e junho deste ano, esses enxadristas participam do Circuito de Xadrez Pinto Paiva, promovido pela Federação Baiana de Xadrez (FBX) e pelo Clube Pinto Paiva no Clube Costa Verde. A cada semana, o campeonato alterna entre as modalidades blitz e rápida. Na modalidade blitz, o jogador possui menos de 10 minutos para realizar uma jogada e na rápida, até 1 hora.

O resultado parcial após a quarta etapa coloca em evidência o talento dos enxadristras negros Nailton Machado e Alan Florêncio, que estão em primeiro e terceiro lugar, dividindo a liderança com Luciano Zallio, tetra campeão baiano. Nailton e Alan fazem parte do Clube de Xadrez Ô Rei, fundado em 2022, que reúne enxadristas que se identificam com ideais progressistas de transformação social.

Anderson Silva, Nailton Machado e Alan Florêncio de Ô Rei, Clube de Xadrez
Anderson Silva, Nailton Machado e Alan Florêncio de Ô Rei, Clube de Xadrez

Nailton conta que começou a jogar xadrez por influência de um amigo. Para o auxiliar administrativo e instrutor de xadrez, o que chama a sua atenção na modalidade é que o esporte exige mérito, e que para ganhar, é preciso entender os erros do adversário e explorá-los.

O jogador reconhece que há um estereótipo racista presente no esporte. Segundo Nailton, que conta já ter sido alvo de comentários preconceituosos, ainda existe um estereótipo de que os negros são mais adequados a atividades físicas, como futebol e boxe, e não a jogos de tabuleiro, como o xadrez.

“A primeira vez que ganhei uma medalha, um dos enxadristas perguntou quem era aquele ‘neguinho’ ali”, relata Nailton, sobre o comentário pejorativo. “É muito triste, mas ainda bem que isso é um caso isolado, e no momento mais complicado da minha vida, tive muita ajuda do pessoal do xadrez”, complementa.

Quem vive a realidade do xadrez e concorda com a percepção de Nailton é a gestora de projetos Gina. Para ela, inclusive, criar uma comunidade diversa no esporte é um desafio. “Salvador é conhecida como a população mais afro do mundo fora da África, mais de 80% da população é de origem africana, mas segundo tenho visto, a participação no xadrez não reflete essa realidade”, relata a jogadora, que enxerga os campeonatos como um espaço de competição no tabuleiro, mas também de formação de comunidade fora dele.

Gina e Nailton jogam no torneio blitz do Circuito de Xadrez Pinto Paiva / Foto: Arquivo pessoal
Gina e Nailton jogam no torneio blitz do Circuito de Xadrez Pinto Paiva / Foto: Arquivo pessoal

Gina foi uma das 6 mulheres dos 76 enxadristas que disputaram o torneio Aberto do Brasil, realizado em Salvador neste ano. Essa baixa participação feminina, no entanto, é uma realidade que a jogadora tenta mudar. Além de fazer parte de Ô Rei, Clube de Xadrez, Gina compõe um movimento baiano independente para mudar esta realidade.

A Liga Brasileira de Xadrez Feminino (LBFX) é uma comunidade que nasceu em 2013 com o objetivo de divulgar, promover e agregar as mulheres enxadristas e envolvidas com xadrez no Brasil.

Atualmente a LBXF conta com mais de 280 participantes e está ativa através dos grupos de trabalho para o fortalecimento de sua gestão, comunicação, organização de torneios, pesquisa sobre o panorama do xadrez feminino, relações institucionais, a articulação com torneios para facilitar e fortalecer o xadrez feminino.

O que é o Clube Pinto Paiva de Xadrez ?

O Clube Pinto Paiva de Xadrez é uma iniciativa da FBX e  presta homenagem ao baiano que foi bicampeão brasileiro em 1966 e 1971. Fundada em novembro de 1960 a Federação Baiana de Xadrez, entidade máxima do xadrez baiano, que teve entre seus fundadores Ruth Volk Cardozo, a primeira brasileira a ganhar o título de mestre internacional de xadrez feminino, heptacampeã brasileira e bi sul-americana, e que representou o país cinco vezes nas Olimpíadas da categoria, conquistando a medalha de prata em 1972, em Escópia, na Macedônia.

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