MUSAS: ampliando o significado da arte em Salvador

Museu de Street Art de Salvador compõe novo cenário dentro da Comunidade do Solar do Unhão, transformando a vida das pessoas

*Por Rayssa Guedes

Domingo quente e ensolarado na Gamboa de Baixo. A Baía de Todos os Santos mais parecia um espelho, tamanho o brilho da água refletindo o sol. Os becos e as escadarias enchiam-se de sorrisos. As crianças, com os rostos pintados de super-heróis corriam, gritavam e brincavam alvoroçadas com toda a movimentação: era o MUSAS – Museu de Street Art de Salvador, que fazia mais uma das inúmeras intervenções artísticas de ocupação e revitalização do espaço da Comunidade do Solar do Unhão. Pintura corporal, grafite, oficinas de break, apresentações musicais e uma feijoada das boas compuseram o evento intitulado “Muda Gamboa” – projeto criado pelos moradores da Gamboa e que contou com a parceria do MUSAS nesta edição, que aconteceu no final do mês de outubro.

Com apenas um ano oficial de vida, o MUSAS já conta com inúmeras realizações. A Comunidade do Solar do Unhão foi o lugar escolhido para esse movimento nascer e se desenvolver, e já tem reunido pessoas de áreas “pluridisciplinares” para interagirem com a cultura através das artes visuais, música, consciência ambiental, reciclagem, moda e turismo cultural, movimentando a comunidade e integrando-se com os moradores através de diversas atividades.

Foto: Rayssa Guedes
Foto: Rayssa Guedes
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História Idealizado pelos artistas Julio Costa, Marcos Prisk e Bigod Silva, do coletivo de grafite Nova 10Ordem, o Museu de Street Art nasceu de maneira espontânea, fruto de mutirões itinerantes realizados por mais de 10 anos. Contudo, fazer mutirão deixou de ser suficiente: Julio conta que, quando a necessidade de fincar lugar e dar um nome àquilo que se estava realizando surgiu foi que eles conheceram, graças a um amigo, a Comunidade Solar do Unhão. A partir daí, com idas constantes à comunidade, os artistas pediram a autorização dos moradores para pintar as ruas e os muros do local. Uma coisa levou à outra e eles acabaram alugando uma casa na região. “A princípio a casa servia apenas como espaço para guardar materiais e fazer refeições. Com o tempo, percebemos o potencial daquele lugar e a casa se transformou também num espaço para exposições, criando um local que pudesse contemplar artistas que não têm a chance de expor seus trabalhos em uma galeria paga. Contudo, como grande parte de nossa arte é feita a céu aberto, vimos que a ideia de museus a céu aberto vinha crescendo e daí nasceu o nome do MUSAS: Museu de Street Art de Salvador”, conta o artista.

Fotos da área interna do MUSAS.  Foto: Reprodução MUSAS
Fotos da área interna do MUSAS.
Foto: Reprodução Fanpage MUSAS

Vivendo de maneira independente há dois anos, o projeto artístico do MUSAS mantém-se apenas com a venda de produções do próprio coletivo, como camisetas, quadros, esculturas. Com o objetivo de criar o próprio circuito cultural, Julio Costa comenta sobre a escolha do grupo em não participar de editais: “Todo mundo fala que a gente precisa entrar em edital, participar de bienal, apoio do gorverno, prefeitura… A gente não precisa. Quando negamos a ideia de que eles são necessários, fazemos o que queremos”, relata Julio. Passando por um novo momento, de revisão de objetivos e no intuito de expansão e itinerância de suas atividades, o MUSAS incorpora o “papel polinizador” da arte contemporânea, que ocupa todos os espaços e acontece em qualquer lugar.

O artista Julio Costa é um dos fundadores do MUSAS. Foto: Rayssa Guedes
O artista Julio Costa é um dos fundadores do MUSAS.
Foto: Rayssa Guedes

Encontros Naquela tarde de domingo, o que se via era a concretização desse objetivo. Artistas dos mais diversos lugares do Brasil e do mundo juntaram-se através do coletivo “Muda Gamboa” e do MUSAS para fazerem arte e levarem à comunidade da Gamboa de Baixo um domingo diferente. Com mais cultura, arte e possibilidades de mudança social e estrutural, a comunidade participou ativamente das atividades oferecidas no evento.

Entre elas, a Oficina de Break se destacou por integrar b-boys de diversas regiões de Salvador, entre eles B-boy Jeomar, da Unidade All Star Crew. “Faço parte da cultura hip hop, principalmente da cultura do break. Mas é muito legal estar com os caras do grafite, do rap… Até mesmo porque o Hip hop não é só o grafite, é uma composição de todas essas linguagens”, afirma Jeomar. Apoiando o projeto, Jeomar também destacou o crescimento da visibilidade da cultura hip hop: “O mais bacana é você ver, num lugar onde só axé e pagode tinham espaço, o hip hop chegar, podendo mostrar sua arte, sua verdade, é uma grande vitória. A Bahia é um grande leque de cultura”, finaliza o B-boy, que ministrou oficina naquele dia. O evento continuou tarde adentro com a distribuição da feijoada, realização de gincana com as crianças e terminou com as apresentações musicais de grupos de rap e DJ’s. Com total apoio da comunidade, o evento já está com planos para futuras edições.

B-boy Jeomar.  Foto: Rayssa Guedes
B-boy Jeomar.
Foto: Rayssa Guedes

Planos O MUSAS atualmente promove campanha pela compra de uma sede para o coletivo, de maneira que se potencializem pontos de intersecção entre artistas, públicos de diversos lugares, e a comunidade. De riqueza inestimável para além das comunidades, o MUSAS tem potencial para vibrar toda a cidade de Salvador – que recebe gratuitamente dele e dos inúmeros artistas formados pela vida, sem diploma ou prestígio no circuito das artes, o poder transformador da cultura, motivado pela crença de que a arte pode melhorar, resgatar, dar bons frutos e ser acessada sem formalidades.

Para saber mais sobre a comunidade do Solar do Unhão, leia também a matéria da Agenda Arte e Cultura sobre o espaço.

Foto: Rayssa Guedes
Foto: Rayssa Guedes

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