O espetáculo Só Não Viu Quem Não Quis é recebido com entusiasmo no Teatro Martim Gonçalves

A Mostra Universitária Salvador de Teatro (MUST) recebeu, na noite da última quarta-feira (22), a montagem Só Não Viu Quem Não Quis, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Com caráter de denúncia e protesto, dentro do contexto social do Rio de Janeiro pré-Copa do Mundo e pré-Olimpíadas, o espetáculo explorou diversas linguagens e foi aplaudido de pé pelo público. 

“Toda produção de subjetividade começa a partir de uma imagem”. A frase faz todo sentido quando terminamos de assistir ao espetáculo Só Não Viu Quem Não Quis, apresentado na última quarta-feira (22), segunda noite da Mostra Universitária Salvador de Teatro (Must). A montagem se destacou por utilizar uma linguagem fora do habitual. Ora drama, ora comédia, às vezes monólogo, mas todas as vezes uma inquietação coletiva, que trouxe à tona questões polêmicas como união homoafetiva, homofobia, aborto, valores morais e crítica ao sistema político. Problemas apresentados com a sutileza de passagens poéticas, através da performance corporal dos atores, dos objetos que percorrem o cenário, símbolos que são inseridos de maneira sutil. Mas, os momentos de denúncia explícita não escapam do enredo que se ancora na trilha sonora com músicas de Caetano Veloso e nas imagens do vídeo documental projetadas na tela.

Mesmo tendo como recorte e ponto de partida a cidade do Rio de Janeiro pré-Copa do Mundo e pré-Olimpiadas, a realidade retratada na montagem não parece distante da vivida em Salvador. A especulação imobiliária, a falta de ética dos empresários, o egoísmo das pessoas são reconhecíveis. A realidade transcende. Nesse sentido, a diretora do espetáculo, Isadora Malta, aponta que não se trata de um problema exclusivo do Rio de Janeiro, mas do Brasil. “Acho que tem uma identificação, um canal direto que fala sobre questões que a gente está de uma forma ou de outra sofrendo no Brasil inteiro. E acho que o espetáculo tem uma identidade de ser hiperlocal. É como se fosse uma camada de um drama que não pertence somente às pessoas do Rio de janeiro”, disse.

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A peça também não poupou crítica à mídia e seus interlocutores. Através de uma personagem caricata, um verdadeiro clichê televiso, Natasha arrancou aplausos e risadas da platéia. Momentos singelos onde personagens repartem suas angústias, fim de relacionamentos amorosos, batalha por respeito e um “lugar ao sol” também foram compartilhadas com o público. O espectador também foi convidado a dançar com os personagens – uma dança sem toque -, no momento mais terno da apresentação. Houve quem se levantou da poltrona e  foi para o palco junto deles. Outro destaque foi o beijo gay embalado pela música “Neguinho” interpretada ao vivo. A ação foi protagonizada pelo ator Caio Riscado e um ator local que estava presente na platéia.

Direção do espetáculo

Quem assistiu aos 100 minutos da apresentação não imagina as dificuldades por trás da montagem do espetáculo. Segundo Isadora, foi um processo muito difícil, inclusive pelo número de atores que tinha que preparar. Correr contra o tempo foi o maior desafio.  “A gente teve muito pouco tempo por causa da greve da UFRJ que prejudicou o cronograma, daí nós tivemos menos de três meses para montar o espetáculo, um espaço muito curto para preparar uma apresentação de uma hora e quarenta minutos”, revelou.

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Mesmo com o cronograma apertado, Isadora disse ter sido prazeroso estar à frente da direção e a temática acabou facilitando. “De alguma forma foi muito natural a criação porque é um espetáculo de coisas que estamos vivendo muito esses dias. Então, isso facilitou. Tudo que a gente falava nos ensaios, tocava, produzia, a gente vivia todos os dias.”, pontua.

Recepção do público

O público, que lotou o Teatro Martim Gonçalves, recebeu bem o espetáculo, aplaudindo de pé ao final. “As pessoas não ficam indiferentes. A recepção é inevitavelmente forte, boa ou ruim. Mas é forte”, disse Isadora, que afirmou também que a recepção no Rio foi muito positiva.

Já sobre a Must, a diretora reconheceu ser uma iniciativa importante, por possibilitar o intercâmbio entre grupos de teatro de diversas partes do país e pelo contato com um público diferente. “Estou achando a mostra uma produção excelente, faz com que a gente consiga respirar, vivenciar com certa intensidade o movimento das coisas que são feitas na cidade, nos grupos. Choque cultural positivo”, disse. Para Susan Kalik, coordenadora geral da mostra, essa troca é essencial. “É uma oportunidade de troca rica para quem se apresenta e muito importante para o público, temos diversas ações que incentivam a formação de platéia e com isso a troca é feita também entre artistas e espectadores”, pontuou.

Como propõe a frase dita no espetáculo e reproduzida no início da matéria, o que cada espectador viu no palco pôde ser interpretado à sua maneira. O resto, só não viu quem não quis.

 

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